terça-feira, 16 de dezembro de 2008

E quando o Natal acabar? O GRITO QUE O VENTO PRECISA PROPAGAR!




by Silvia Mendonça*

Tudo bem! No Natal renasce em cada um a esperança, o sonho, a vontade de ajudar o próximo, o desejo de mudanças. É momento de alegria! Um dia para perdoar, encontrar os amigos. Chamar a sogra e cunhados para repartir a ceia. Happy X (mas) - War is Over, diria John Lennon em sua música que cobre todos os países e idiomas. As guerras intestinas dão uma pausa nestes dias de paz (será?).

No Natal, as crianças adoçam os corações dos pais, trazem de volta as memórias natalinas de outros tempos, as lembranças de uma infância num mundo diferente desse dominado pela filosofia material, pelo consumismo desenfreado e pela vontade louca de comprar uma roupa de quinhentos reais ou de trocar um carro pelo financiamento eterno. Os corretores esquecem o cheiro do dinheiro, os capitalistas brincam de amigo secreto, o empresário paga com gosto o 13º salário.

No Natal, os brutamontes diminuem as práticas criminosas - espancam menos, matam menos, roubam menos (será?). Os doentes perdoam a doença. Os apaixonados dão um tempo ao amor sublime e repartem carinho com parentes e amigos. As prostitutas, algumas delas, fazem o serviço de graça e os desgraçados encontram uma família temporária. Os distritos policiais brindam a ceia quase que sem registros materiais. E a Justiça liberta condenados para visitar familiares.

No Natal, que é apenas uma data concorrente ao nascimento de Cristo, os homens se reencontram. Não existe explicação nas leis naturais, no lado racional da humanidade nem mesmo na prática política de cada homem. Mas Natal é tempo de repartir, de compartilhar a fartura. De dar. Estamos entubados de boa vontade nesses dias. Se alguém pedir, você é capaz de dar o que não tem. Tiramos da nossa boca para oferecer ao próximo que estende uma mão enrugada pedindo moedas.

Mas é preciso reflexão. E quando o Papai Noel vai embora, a árvore se desmancha e ficam as crianças famintas nas ruas, estupefatas com um país que implementa, de forma lenta, as mudanças sociais, com uma sociedade desumana e sem vontade de modificar a real estrutura de poder que coloca o Brasil como potência inerte? Desmoralizado frente às denúncias de trabalho escravo nas plantações do Pará, nas carvoarias de Goiás e no trato absurdo frente às família que sobrevivem com um salário mínimo (enquanto seus parlamentares vivem com o máximo), o País cega os olhos durante os outros meses.

O Natal deveria tocar a todos. Todos os anos, todos os meses. Se existisse espírito natalino durante outros dias, a vida do próximo não teria virado uma bobagem no resto do ano. No Natal, a filha não ousaria matar os pais, o homem da Merçedes jamais fecharia a cara para o porteiro do seu condomínio.

Mas vira-se a data e o homem é outro. No seu dia-a-dia, surge o desbunde da ganância. Somos hipócritas. Buzinamos pelas ruas, ofendemos idosos, fofocamos nas costas dos amigos, comemos mais do que necessitamos. Desejamos o fracasso para a vitória do concorrente. Aumentamos o preço dos produtos apenas para garantir um lucro maior no final do mês. E assim a indústria farmacêutica aumenta preços apertando o coração de doentes e o pivete prefere roubar o som do carro a procurar ensino profissionalizante.

Em menos de tinta dias, somos jogados de volta na Idade Média dos pensamentos. Defendemos a usura, o capital, a propriedade, o discurso da vontade e do poder. Em questão de horas, o Natal fica incolor. Perde o gosto. Abandona nossas retinas, dando lugar ao massacre cotidiano de um país maldito onde as grandes corporações só se preocupam com joguetes políticos.

Aos bárbaros que no Natal se vestem de boa pessoas, de caridosas almas, que estendem as mãos com presentinhos e badulaques, um sincero pedido: que o espírito natalino toque a todos de verdade. Que Santa Claus dê a vocês o antídoto eterno para a sensibilidade e que olhem os esfarrapados nas ruas. E que façam do Brasil um país maior do que os caras-de-pau que nos governam.

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